Pular para o conteúdo principal

É tudo e nada.

Ser radical? Será que isso é tudo (ou nada)? Ou o que voga é o meio-termo de uma vida mais ou menos? O que importa é viver ou ser vívido? Aliás, devemos viver pela razão ou ser fruto da emoção? Quer dizer, devemos? Devemos nos preocupar com a fronteira entre o pensar e o sentir? Eis o embate entre emoção e razão de que sempre me esquivo.

Não quero me fechar, me enclausurar num comedimento traumático, nem me entrevar em cima de uma cadeira de mágoas. Afinal, não é porque vejo uma história se repetindo que ela vá ter o mesmo desfecho. Contudo, o problema é que ela se repete. Mal cogitamos um novo final e o previsível já está lá, prostrado, como um banquete sensacional, ao qual nossa dor da fome não pode recusar.

É, leitor. É fácil falar. Assim como também é fácil ler, estudar, trabalhar... O difícil mesmo é sentir. E, sobretudo, esquecer de sentir. O sentimento independe da sabedoria. É como domesticar um ser selvagem. Onde já se viu: urbanizar o gato-do-mato!? O gato-do-mato urbano é um gato doméstico, sem o brio e a identidade inata daqueles da selva, vivendo num terreno incabível, desfavorável, forçado. E o pior: ele é falso. Falso porque maquia, mente, finge, mas tá lá, comprimido, dentro, sofrido, louco pra existir de verdade, sem cores ditadas ou truques circenses. Fazendo-me concluir que não dá pra domesticar sentimentos.

Ou dá?

Ser paciente, íntegro e compreensivo frente a suas próprias limitações; fazer boas escolhas; planejar uma vida estável; galgar rumo ao ideal.

Olhando por esse lado, me bate certa angústia. Como eu queria uma vida com esses atributos! Como eu queria chegar lá! Viver tal qual no Éden antes da serpente. Sob disciplina e determinação, com a fé de que o presente será sempre bom, porque não há vestígios sequer do conhecimento do mal. Contudo, eu sei que pra isso se faz necessário saber passar pelos percalços do caminho, sem cair em tentação ou ser atraído pelo magnético sentir. E sei que isso nada mais é do que ter o gato-do-mato doméstico a ronronar em cima do tapete da sala. Daí a angústia. Dessa incompatibilidade do desejo íntimo entre ser como eu quero e fazer como eu gostaria.

Então, eu paro. Espreito o que me passa ao redor e finalmente aceito que sou falho. Aceito que eu vou acertar e vou errar. E se aquilo em que eu acertar, der errado, faz parte. E se aquilo em que eu errar, der certo, também faz parte. Whatever works. Embate resolvido: sei que tudo tem um propósito, mas não me cabe saber que propósito é esse.

Ou cabe?

Comentários

  1. Inventei uma regrinha agora: te dou 15 minutos por dia pra você se fazer todas essas perguntas e procurar todas essas respostas. Se conseguir, ótimo, senão... esquece delas até o dia seguinte e viva/sinta apenas.

    ResponderExcluir
  2. deixa ver se eu entendi: vc sabe que vc é falho, que aquilo q vc vai fazer pode dar certo ou pode dar errado, e qndo dá errado é bom porque vc aprende alguma coisa, não é? então pq essa tensão toda de entrar em algo q vc já sabe o fim? ora, entra e tenta aprender tudo que for possível!

    ResponderExcluir
  3. concordo com o Foxx ... aff ... pelo menos uma vez nos entendemos ... rs

    ResponderExcluir
  4. O homem vive sobre uma gangorra, os tolos procuram um ponto central de equilíbrio que não realidade não existe, os sábios aprendem o jogo do subir e descer.

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

Tá.

Seu corpo tem a chave dos meus desejos. Seu beijo: língua na minha libido. Peito cheio de aspirações: que também me pira e inspira. Seu jeito, sua voz, seus segredos, seus sussurros, suas taras: tudo. Sem medos ou grilos de mim. Silêncio corrompido pelo seu gemido. Tudo agora tem sentidos: vai e vem. Sua carne boa, sem nervos, no ponto, suculenta. Obrigado, mas sem brigar comigo. Leve levo a sua cintura – que me aprisiona como um bambolê. Seu ciúme: minha alforria. Você talvez não saiba, mas eu sei onde você sente. Afinal, como você vai embora, algo fica pra sempre pra trás. Aliás, você não vai mais embora. Você virou minha pintura, quadro vivo na minha memória. Queria saber desenhar... mas pra quê? Se eu posso escrever sem pontuações as mais diversas versões de como você tá suas FR /sɥa/ verb second-person singular past historic of suer suer -uːə(ɹ) UK US noun Someone who sues; a suitor. suer FR /sɥe/ verb to sweat ...

Meu Herói,

Se afastei você de mim, não foi por maldade. Quis te proteger de me proteger. Os segredos, os medos e os desejos imprecisos. As saudades, as verdades e os sentimentos encobertos. Clássicos elementos de um drama perverso. E você não é isso. Pelo contrário, você é muito mais que isso! Seu gênero é aventura, é descoberta! Mais um herói se salva da minha teia. Torço por você enquanto você se contorce por mim. Mais uma vez aquela música. Procuro na rua o cheiro da minha danação. Fragrâncias similares me apontam a direção da culpa. E aquela dor que gosto de sentir, feliz e infelizmente, já não vai fazendo tanto sentido. Certamente meu herói me salvou do meu maior vilão, meu eu-zumbi. Hoje percebo com cada vez mais clareza a inútil diferença entre raiva e tristeza. Aprendo diariamente sobre os meus sentimentos, à medida que me afasto de mim. Eu me exploro. Descubro-me através dos ares, lares e pesares. E foi aí, inclusive, que encontrei você, meu herói. Entre as nuvens – do cabelo aos pés. En...

Caminhos

Ainda me pergunto onde é a fronteira entre raiva e tristeza. Heranças da relação, promessas inescapavelmente fugitivas, mais um crime sem solução… Vários são os caminhos dessa longa estrada. Como as visões distorcidas da vida após a morte. Afinal, zumbis só se alimentam no imaginário. Mas o que é viver senão um passeio no mundo dos pensamentos? Viajo por entre memórias e projeções. Percebo o óbvio: só tenho esse presente. Uma bússola estática me navega desde o Norte até este Janeiro. Ela me aponta raivas e tristezas. Não somente as que vivi, mas sobretudo as que com prazer compartilhei. Eu me esforço muito para discernir quais sentidos — raiva ou tristeza — eu devo ou posso seguir. Entro na contramão de vez em quando. Atalhos da vida linear. Mudo de marcha e meu câmbio sempre me impulsiona ao exterior. Belos horizontes despontam novas experiências. Não só excrucia ou extermina o melhor de mim, mas também excita e exercita. Percebo o que a estrada sempre quis mostrar: o caminho a frente...