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Mostrando postagens de novembro, 2010

Fuio.

Foi-se como quem dorme bem. Não que lhe atribui a morte plácida, mas sim a morte simples. O ponto final da reticência que sua vida lentamente escrevia. Talvez estivesse contente afinal, contudo seu rosto era inexpressivo. Era intrigante porque o corpo estava todo contorcido. Parecia-se um feto com um rosto cor de geleia. Os olhos estufados alegavam nada além de que seu rosto coisa alguma avistava. Conclui-se que a dor era só dor emancipada. Separada e impregnada no corpo, mas não na alma. Olhos de felicidade? Já não se havia brilho para afirmar. Quem sabe olhos de completude, porém não de dever cumprido: como foi dito: o ponto final da reticência: um fim da vida já terminada. Mudou-se para aquela cova retangular um mês depois que sua mulher o dispensara. Passou o mês entre a vida familiar e a cova familiar numa pousada um andar acima de um boteco freqüentado por putas e velhacos viciados em craque. Experimentou craque e gays um dia, todavia se enfadou. Cansou-se porque não se viu f

Paixões.

Primeiras paixões. Ah, as primeiras paixões! Tudo se torna tão belo! Os dias são eficazmente mais brilhantes. Aquela prova de química? Foi 3, mas valeu como um 10! Nas primeiras paixões tudo é assim: mais bonito. Inédito, pra dizer a verdade. Inédito porque é algo completamente novo contemplar a beleza da vida comum por esses olhos ardentes. Ah, as primeiras paixões! É também nas primeiras paixões que queremos compartilhar as primaveras. “Mandar flores ao delegado, bater na porta do vizinho e desejar bom dia, beijar o português da padaria” e tudo o mais pra que todos reflitam do mesmo modo os fótons amorosos do nosso farol ocular. Queremos tanto esse mundo perfeito que até nos iludimos pensando que nos subjugaríamos para que o mundo fosse cada vez mais cintilante quanto nossos olhares. É a tentativa de perdurar o gozo infinitamente efêmero dos suspiros do ‘eu te amo’. É lindo! Não disserto para não-apaixonados, porque se já é difícil expor uma ideia, imagina transpassa-lá para pesso

Dar uma volta.

Bebê, vamos nos ver hoje? Acho que vou mandar isso, afinal, não perco nada se ela não quiser sair comigo hoje. Aliás, eu perco: não terei com quem gastar camisinha. Tenho que escrever algo arrebatador, algo que não lhe dê escapatória a não ser entrar no meu carro e ter um leito de prazeres dispendiosos. Gostosa, vamos trepar agora? Nunca! Que mulher gostaria de ser tratada assim? Todas, mas hipocritamente negam. Princesa , ou melhor, Princesinha — elas sempre cedem aos diminutivos. Princesinha, vamos trepar agora? Ainda está agressivo. Já sei: vou mudar a intenção. Princesinha, quer tomar Milk shake? Milk shake? Não! Ela, por certo, vai pensar em como eu queria que ela sugasse o canudinho até o fim do leite cremoso do copázio. Deixe-me pensar. Por que ela gosta tanto de ser chamada de princesa? Ela é nobre, linda e inacessível e para poder ter-lhe em meus braços tenho que ralar muito, assim como Aladin e Jasmine. Isso: Aladin! E o meu carro é o tapete mágico... Princes

A amada professora.

— Com licença, professora, eu poderia assinar a lista de chamada? — A aula já acabou. — Eu sei, professora, mas o que é que custa? — Lógico que não. Eu tenho uma reputação a zelar! — E eu um relacionamento a manter! — ... — Hoje é o aniversário de 3 anos de namoro, então tive de... — Desculpe interromper, mas não vai dar. Isso não é motivo! — Não é motivo? Você parece minha namorada. Nada para ela é motivo. — Viu como anda a sua reputação? — Não, professora. Você não entendeu: ela nunca compreende o meu lado, tal qual você agora. — Agora e há duas semanas consecutivas. — Acho que vocês duas sentem prazer ao me ver assim, humilhado. — Como é? — Aliás, digo que a senhora parece com ela, mas cada qual é única, eu sei, e não tem como responderem da mesma forma a um mesmo estímulo et cetera e tal. Porém, a senhora é bem mais coerente e, absolutamente, mais inteligente. Porque a senhora me detesta por justa causa. Ela, não. Você acredita que ela estava cogitando m

Mereço

Eu sou a raiva em tempo de paz. Eu sou o amor do satanás. Sou a canção de rima errada. Sou sempre sim e nunca nada. Sou o décimo terceiro ponteiro. Sou um jabuti ligeiro. Sou o email do carteiro Sou o 30 de fevereiro. Sou de gala e roupa rota. Sou do deserto uma gota. Sou uma palha no incêndio, folha vazia do compêndio. Sou o rico de bucho seco. Da flor sou o esterco. Sou um pássaro de pelo, a alegria de um pesadelo. Eu sou assim, o bom que é ruim, o contrário do avesso. Eu sou o que eu mereço.

Negócio da China.

— O que é castrado? — Por que a pergunta, Júnior? — replicou o pai. — Vi hoje na TV que os gatos de rua tinham que ser castrados. Aí eu não sabia o que significava. — Ah... É o seguinte, Júnior: os gatos de rua transmitem doenças a nós. Para que eles não se procriem, se faz, então, sua castração. Deixando-os castrados. — E isso é ruim? — O quê? — Eles se procriarem. — Procriar é se reproduzir. É passar adiante a herança genética da família. Como eu posso dizer? É ter filhos, entende? — Para que mais pessoas não peguem doenças dos gatos! — Isso mesmo! — Ah, bom... Cacazinho era filho de Castro e Teresa Canavarro. Sua alcunha veio da aglutinação de Castro Canavarro de Oliveira Júnior, dada com muito carinho pela sua mãe, que, por sua vez, atribuiu à forma caprichosa que seu sogro chamava o marido, Cacá. Por muita paixão e dedicação ao lar, ambos — Castro e Teresa — logo entraram em acordo que aquilo que se expandia no ventre de Teresa haveria de se eternizar com o