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Mostrando postagens de julho, 2022

Movimentos

Foi quando me vi com saudade do futuro que percebi o quanto estava perdido. Um vazio anacrônico me enchia de vergonha. Ora! Como poderia eu sentir saudade do que nunca tinha sido? Expectativas serão sempre desleais, já diziam os seres da Mata. Não é também que o passado me azucrine. Hoje em dia consigo, embora com dificuldade – confesso –, aceitar o óbvio. Sim, o passado já passou. O que talvez incomode mais é o gosto do futuro repetindo o passado, travoso como um Caju ainda imaturo.  Sinto-me envolvido num movimento qualquer. Nele, finalmente, vi o momento certo de errar. O objetivo é tão importante quanto o trajeto. Da travessia do Nascimento até esses tempos modernos dos Santos, tudo é um ciclo. Enrijeço ao me enfraquecer e me enfraqueço ao enrijecer. Quem se admite perfeito só não admite isso pra si mesmo – de resto, tudo perfeito, claro! Convenhamos: o equilíbrio é uma falácia gostosa. Do lado de cá, adoramos apelar para uma persona que criamos em nós e de nós: perfeita nas suas i

Cartão Vermelho

Da cor do amor. Foi assim que me tingi quando te conheci. Uma cor que nos era impossível, mas que milagrosamente em nós estava estampada na testa. Jogadores afoitos do jogo da vida. Ah, como faziam falta! Era cartão em cima de cartão: amarelo aqui, amarelo acolá... Até o juiz perdia o juízo às vezes!  Mas no geral, tudo tornava-se muito simples. Era a vida que lhe dava muitas rasteiras, portanto driblar do inevitável era uma necessidade! Carpe diem  seu peito dizia. Aproveitar cada segundo da vida! Cada momento poderia ser bom! Era essa sua mensagem. Tão trivial, tão óbvia, tão âncora... e que apesar disso, sempre esquecida.  Cartão vermelho é o fim do jogo. Dói, dá raiva, mas por fim fica uma esperança de que no próximo jogo tudo mude. Já a morte é cruel, pois ela é o fim dos jogos e de todas as suas grandes emoções.  A morte é algo que avisa pro nosso peito que agora só nos restas as pequenas emoções, que tudo pode ser muito breve... mas também eternamente lindo na memória.

Visita surpresa

Eu não sabia aonde você tinha ido parar. Fazia tanto tempo que você não aparecia! Por um instante eu nem acreditei que fosse possível: você aqui de novo!? Eu não sabia se você estava morando no Ceará ou somente nas minhas expectativas.  Está chovendo. Você chega sem bater na porta, traz as roupas do varal e atravessa meu corredor. Invade todos os cômodos como inundação. Coloca uma música, equaliza o som e me faz dançar! Só sei dançar com você também. Pude sentir o seu perfume pela sala. Em meia-hora você mudou minha vida. Você acredita que vivo até hoje com a sua herança? Fiz seu café. Tapioca com leite de coco, se me lembro bem. Olhei seus olhos e eles revelavam uma tranquilidade cândida. Era como aquelas aparições angelicais que o povo de antigamente dizia ter. Suas feições eram serenas, um quase sorriso meio safado, meio transigente. Era lindo esse sorriso. Você já vai? Tudo bem. Obrigado pela visita. Eu estava mesmo morrendo de saudade! Volte sempre! Volte mais! Apareça, amor-própr

100 sentidos

Vários sentidos para seguir também não me fazem sair do lugar. Os sentidos que me atravessam me dão possibilidades às quais resolvo me agarrar. Aceito a impermanência porque lutar contra ela é inútil. Eu sei que é difícil procurar a si mesmo. Mas tenho certeza de que fugir é ainda pior.  Os olhares focam nos defeitos e o coração, nos medos. A mentira é a lei. Não gosto de nada disso. Todos querem ser protagonistas na vida dos outros. É sobre isso e tá tudo bem, né? É apavorante a necessidade de aprovação! Desossei todos os meus leões e fi-los filés. Assim, perdi a graça para gente sem graça. E que bom! Amoleci minhas carnes e, dentre elas, o coração. Aprendi-me mais forte e mais fiel a vida por isso. Aonde quer que eu vá, a procura me procura. Escapulo ao que me é expatriado. Mais uma vez: sem nem saber por quê. O instinto é meramente Karnall. Indo mais fundo dentro de mim, eu chego mais longe. Viajo entre línguas e horizontes. Delícia de novo! Delícia do novo! As águas que outrora