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Sobre escrever

A primeira coisa que me vem à mente quando penso sobre o porquê de escrever é o sentimento de angústia. É esse sentimento de angúsita o responsável pelo exercício da escrita. Não diria, entretanto, que escrever seja uma arte angustiante. Afinal, coisas de conteúdo muito pródigo podem advir com a escrita também. Falo apenas do fato que aquele que escreve (que nem sempre é escritor) tem em si algo entalado na garganta, apertando o peito e que lhe motiva impreterivelmente a escrever.

A arte da escrita, para mim, é consolidada na resolução da angústia. Sim: a angústia é um quebra-cabeça cujas peças você tarda a encaixar. E esse tardar, essa sensação de perda de tempo que a demora causa começa a se dissipar quando a explanação ocorre de modo fluido e, principalmente, honesto. A escrita é a angustiante saga para correr contra o tempo em solucionar questões da alma, questões que você quer e precisa explanar para si mesmo, pra entender de outra visão como também para dimensionar suas causas.

De maneira escatológica, diria que escrever é um excremento da alma. Cada palavra que vem pro papel é algo que você ingeriu e agora tá expelindo. Frase a frase, tudo passou por sua alma e ganhou um novo e único sentido. Nem sempre o que se consome é bom e, portanto, o que sai também não será. A escrita é o bagaço filtrado do suco da vida, momento líquido da alma que se torna sólido estampado no papel.

Por analogia, a angústia é o excremento da alma. E é esse excremento que eu preciso de uma vez por todas expurgar de mim. Para enfim descrever o antônimo da escrita, o avesso da angústia, a paz do ponto final.

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