Pular para o conteúdo principal

Maquiavélico.

A hipocrisia de transferir os problemas para tudo que é externo, porque pega mal dizer “desculpa, mas o problema sou eu” – tenho que abandonar. O futuro vem do que eu farei hoje – e nós no futuro só apertarão. Não que o abandono seja cruel ou covarde, mas uma superfície áspera é muito mais eficiente do que uma espelhada quando se quer firmeza. Além do mais, não importa o quanto formos contra, sempre haverá algo inalcançável pelo qual lutaremos em favor: seja aquela solidão incurável, seja esta sociofobia intermitente. Resta, entretanto, escutar. Resta, portanto, aprender que nem tudo é ensinar e falar.

Ninguém é tão especial assim, nem tão diferente, nem tão igual. Porque ninguém fala por si, nem escuta, nem age. Isto é, ninguém não existe. Todo mundo sabe que ninguém não existe. Aliás, ninguém me disse que todo mundo sabia, não aprendi só. E só sempre seremos, não importa o quanto maquiemos ou maquinemos para o contrário: todo mundo está só, mas ninguém está sozinho.

Os que são diferentes precisam se explicar por existirem, pois os iguais não concebem facilmente o óbvio e se irritam – com suas razões – por não entenderem o incompreensível. O caminho todo é incerto. Viemos do acaso e para o acaso vamos, evoluindo. Evolução dói. Abandonar o lar dói. Cair de bicicleta dói. Levantar vôo dói também. A dor vai acompanhar todo o percurso e aí? Ficar com ela ou abandonar e fingir que ela não vai te acompanhar?

Mudar a condição humana é tão eficaz quanto perguntar o porquê de uma pessoa ter desistido de um relacionamento e ter voltado atrás dias depois. A lógica moral não se aplica à vida real. A moralidade não tem sangue, nem anda, nem come, nem nada. Ela, a lógica moral, nada mais é que o ridículo medo do ridículo. E “viver sob certos preceitos” é infinitamente diferente do que “viver de acordo com certos preceitos”. A regra da vida é viver – sem medo de errar. Os erros estão para os acertos assim como ninguém, para todo mundo – abstratos, relativos e semi-inúteis. Só o futuro dirá e esperar, aprender e escutar – para mim – são estratégias para viver.

Comentários

  1. Falar o que desta inspiradora e sensível "filosofia" do SER? Nada, definitivamente nada ... só ler, reler e refletir ... obviamente compartilhar tb ...

    beijão

    ResponderExcluir
  2. Tanta coisa pra pensar aqui... Tenho que digerir esse texto.

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

Tá.

Seu corpo tem a chave dos meus desejos. Seu beijo: língua na minha libido. Peito cheio de aspirações: que também me pira e inspira. Seu jeito, sua voz, seus segredos, seus sussurros, suas taras: tudo. Sem medos ou grilos de mim. Silêncio corrompido pelo seu gemido. Tudo agora tem sentidos: vai e vem. Sua carne boa, sem nervos, no ponto, suculenta. Obrigado, mas sem brigar comigo. Leve levo a sua cintura – que me aprisiona como um bambolê. Seu ciúme: minha alforria. Você talvez não saiba, mas eu sei onde você sente. Afinal, como você vai embora, algo fica pra sempre pra trás. Aliás, você não vai mais embora. Você virou minha pintura, quadro vivo na minha memória. Queria saber desenhar... mas pra quê? Se eu posso escrever sem pontuações as mais diversas versões de como você tá suas FR /sɥa/ verb second-person singular past historic of suer suer -uːə(ɹ) UK US noun Someone who sues; a suitor. suer FR /sɥe/ verb to sweat ...

Na cigarreira.

O vício sempre parece uma boa opção em algum momento. A gente nunca consegue ser invicto contra ele. Parece que ele, o vício, é a única solução que nos aceita e nos é impossível renegá-lo para sempre. A vontade contumaz fica lá, urdindo pela sua recaída, até que ela vence dessa vez (mais uma vez). Resiliência silenciada na calada da noite das respostas que tive que inventar. Aquele silêncio do estalar da pólvora pra retomar o fôlego. Sempre recaímos. Em uma hora ou outra inevitavelmente tropeçamos. É ilógico pensar que não recairíamos. Não é um Lucky Strike (golpe de sorte), sabemos disso. Mas continuamos jogando, afinal um gol contra os sete que já marcamos não nos fará perder a partida. Dois cigarros: um pra mim, um pra meu amor-próprio. Eu e ele tragamos, transamos e trazemos novos paradoxos pro velho cinzeiro. As cinzas dos pensamentos renascendo como fênix e morrendo – como fênix. Dois cigarros: um pra morte e outro pra vida. Medo e desejo brincando na corda bamba da distância. U...

Caminhos

Ainda me pergunto onde é a fronteira entre raiva e tristeza. Heranças da relação, promessas inescapavelmente fugitivas, mais um crime sem solução… Vários são os caminhos dessa longa estrada. Como as visões distorcidas da vida após a morte. Afinal, zumbis só se alimentam no imaginário. Mas o que é viver senão um passeio no mundo dos pensamentos? Viajo por entre memórias e projeções. Percebo o óbvio: só tenho esse presente. Uma bússola estática me navega desde o Norte até este Janeiro. Ela me aponta raivas e tristezas. Não somente as que vivi, mas sobretudo as que com prazer compartilhei. Eu me esforço muito para discernir quais sentidos — raiva ou tristeza — eu devo ou posso seguir. Entro na contramão de vez em quando. Atalhos da vida linear. Mudo de marcha e meu câmbio sempre me impulsiona ao exterior. Belos horizontes despontam novas experiências. Não só excrucia ou extermina o melhor de mim, mas também excita e exercita. Percebo o que a estrada sempre quis mostrar: o caminho a frente...